domingo, 14 de junho de 2009

« Estórias » e desejos na Lisboa do século XXI




Era uma vez...

No meu tempo todas as grandes histórias começavam assim, talvez para que não tivessemos duvidas de que o que se seguia era de facto uma grande história, daquelas, com principio, meio, fim, e um ensinamento.´

Nessas histórias, por norma, os bons e os maus eram fácilmente identificados e todas as princesas encontravam um principe que as conduzia à felicidade eterna.... quase sempre no preciso momento em que a história deveria começar... casaram... e foram felizes para sempre.

Nelas todas as mulheres procuravam um homem, um amor incondicional, um casamento como unico caminho para uma felicidade certa e inquestionável.

Aprendemos a adormecer e sonhar com essas histórias, que preenchiam, na infancia, os nossos sonhos de fitas e folhos cor de rosa, de sorrisos e de suaves beijos.

A Sandra Vanessa cresceu no Norte a devorar os livros com histórias de principes e a sonhar que um dia também ela encontraria o seu.... imagináva-o com 1,85m, forte cabelo negro, um cargo de chefia, um BMW, Loft em Alcantara, solteiro , simpático e disponível....

A Sandra Vanessa ainda acreditava, aos 30 anos, no Pai Natal, que o D. Sebastião voltaria e que encontraria algures o seu amor, a quem já chamava « O mais desejadinho ».

Sandra Vanessa deixou o Norte num dia de chuva e veio instalar-se num estudio, numas águas furtadas da Rua Damasceno Monteiro, com vista para a Graça e de onde podia, se se debruçasse ver, ás terças e sábados, o frenezim que se instalava na Voz do Operário em direcção à Feira da Ladra.

Sandra Vanessa dormia, todas as noites aconchegada pelo edredão de plumas sintéticas e pelo ursinho cor de rosa que lhe saira na máquina do café do Sr. Joaquim, em noite de Romaria da Sra. dos Remédios.

Perdia as noites a sonhar, á janela, e os dias a responder aos pedidos, sempre urgentes, do Dr. Silveira, o director da financeira, que secretariava.

Cinco anos volvidos, Sandra Vanessa tinha já esgotado todas as possibilidades.

Saira durante um mês com um tipo girissimo, que conhecera no Lux, e que depois a apresentou ao namorado, alto, espadaúdo e com relógio JAGGER.

Experimentara, durante alguns meses, a companhia de um homem mais velho, simpático e aparentemente apaixonado, tolerando a barriga e o mau hálito, que se tornaram depois insuportáveis.

Sujeitou-se estoicamente à boca de pato, fina e pegajosa, e aos beijos repenicados do colega de óculos e fato cinzento, que durante meses teimou apresentá-la à mãezinha, e que conseguiu fintar, trocando-lhe as voltas, numa noite quando jantavam no Eleven.

Suportou o ressonar roncado do PT que conhecera no ginásio, e que acusava à noite o cansaço instalado pelo excesso de abdominais.

Depois de alguns meses de jejum sabático, e de descanso reconfortante e merecido, Sandra Vanessa, recusou o aumento de salário e a proposta de promoção e resolveu voltar para a sua terra natal.

Em Lisboa nunca mais ninguém soube ao certo o que lhe aconteceu....

Há quem diga que aceitou o pedido de casamento de um primo afastado, com 1,60m, de poucas falas, e desempenho sexual irrepreensível....

Outros garantem que professou...

Outros ainda que abraçou a causa gay e dirige, com a companheira, o novo MELGA – Movimento de Esquerda Lesbico e Gay de Avintes.

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