quinta-feira, 5 de março de 2009

Honestamente... por vezes é bom recordar ( porque há imagens que nunca deixamos adormecer )



Longe iam os tempos em que gostava de guardar, religiosamente, no sotão todas as coisas que iam passando de moda ou perdendo oportunidade na sua vida quotidiana, mas que por algum motivo ficavam sempre presas ao seu coração.

Tivera, durante muito tempo, um apego desmesurado, e demasiado, ás coisas materiais que tinham quase sempre uma história, e que mesmo depois de verem acabados os seus dias de glória, continuavam guardadas, pelo que haviam sido, pelo que recordavam... ou pela esperança, quase sempre vã, de que poderiam voltar a ser oportunas, necessárias, recuperadas... como se acreditasse que ainda poderiam as memórias, os afectos, as certezas passadas, apagadas, mortas, ser um dia recuperadas, reinventadas....

A chuva que não parava de cair, inoportuna, inesperada, fora de tempo, levara-a ao sotão, na ãnsia de se conseguir livrar de alguns objectos há muito irrecuperáveis, e de conseguir lugar para outros, que ainda queria acreditar virem a ser úteis, necessários... ou em relação aos quais ainda se sentia demasiado presa....
( todas as separações são sempre dolorosas... ainda quando já não acreditamos, há muito, na existência de uma ligação - ou necessidade - com futuro viável e possível )

Na sua frente encontravam-se no chão, a um canto, diversos discos de vinil, muitos deles com os sucessos dos distantes anos 80, que, a seu tempo, haviam gasto a agulha do velhinho gira-discos, que não conseguira resistir com a mesma sorte ao correr dos anos... ( interrogava-se agora porque mantivera os discos, sem a possibilidade prática de os ouvir ... quantas vezes não guardamos na vida ou nas memórias, aquilo que sabemos nunca mais nos vir a ser útil? Conservar, implica não ter de decidir, e não decidir, não sermos confrontados é sempre o mais fácil... )

Entre os velhinhos discos encontrava-se perdido um que continha uma música que não fazia parte das suas recordações, mas o titulo despertou-lhe a atenção e a curiosidade - « Honesty »... A letra da canção, transcrita no verso da capa de cartão , deteve-a por momentos... mas não lhe prendeu a atençao por demasiado tempo.... a palavra honestidade transportou-a, contudo para outra dimensão....

Honestidade, verdade, frontalidade, liberdade... quanto não poderiamos todos ganhar se integrassem o nosso dia a dia?

Com elas o Ralfh Finnes e a Kate Wesley poderiam ter vivido um grande amor e sido felizes para sempre, no « Leitor »...

Com elas a Claudia Vieira e o outro moço francês ( aquele que consegue estragar um elenco de luxo, português , escolhido a dedo, onde entre outros brilham e enchem o ecrã os nossos Pedro Lima e Paulo Pires )poderiam ter sido um casal apaixonado em « Second Life »....

A Rachel e a irmã... poderiam ter sido amigas, cumplices,confidentes... no « Casamento de Rachel »...

Com aquelas palavras simples, poderiam ser evitados muitos equivocos, muitas confusões, muitas mágoas...

Talvez com elas todos e cada um de nós pudesse viver uma outra vida « uma Second Life » com partida dos pressupostos que determinam a vida de cada um, mas com a diferente sequência que lhe seria dada por elas....

Honesty is such a lonely word
Everyone is so untrue

Com elas o Sean Penn ganhou o Oscar dado pela Academia.... e o Rourke o que lhe é dado por mérito por todos quantos apreciam a verdade, a honestidade que o seu wrestler empresta aos ultimos momentos do filme... e... provávelmente, da sua vida...

Com elas, todos e cada um de nós... poderiamos, certamente, ser muito mais felizes...


E talvez o próprio do Mickey ainda tivesse guardado algo do sedutor que, também nos anos 80, nos fez render...


6 comentários:

nomundodalua disse...

Que belo argumento tinha este filme! Apesar dos sucessivos clips softcore que na altura parecia que seriam para sempre. Não são. Mas o Mickey Rourke a comer spaghetti numa das cenas, isso sim!
Outro exemplo de amores que se consomem em pouco tempo porque não podem dar o passo para a honestidade, mas em bom: A Bela do Senhor, escrito por Albert Cohen.
No ano em que este filme estreou, “Não Sejas Mau Pra Mim” ganhou o Festival da Canção.
Belinha, não deites fora o vinil.

suprónia insuflávia disse...

Estava na adolescência quando fui sozinha ver este filme na sala Estúdio do Mundial, ali para a Alameda, no cinema que hoje é da IURD. Lembro-me que saí com o erotismo à flor da pele e a achar (desejar)que havia um Mickey Rourke ao virar de cada esquina... Dentro do mundo das recordações de belos amores concretizados lembro um dos meus livros de cabeceira e filmes de eleição - "L' Amant" da Duras.
Fica o link para a trailer:
http://www.youtube.com/watch?v=NNNQ4ztrEoI

Belinha disse...

Pois é Proninha, também foi precisamente nesse cinema que eu vi o filme, um dos da minha vida... por tal sinal, acompanhada por um matulão, de nome João... mas isso são outras histórias ... e outras recordações...

norrin disse...

l'amant, ah, l'amant.
confesso que, mesmo hoje, me estimula muito mais a recordação do corpo dele do que a do da lolita.
nesse dia, a minha vida podia ter feito um zig, mas seguiu pelo zag...

mouche albértine disse...

quanto ao amante da china do norte poderia contar algumas histórias em que a literatura e a realidade se cruzam.mas não é este o local adequado. lá para o oriente juntem-lhe in the mood for love do won kar way de uma sensualidade latente a rebentar pelas costuras.

Anónimo disse...

prefiro o wong kar-wai das latas de ananás fora de prazo. e one from the heart do coppola? não filme da vida (quando o plex vivia filmes) mas talvez o mais visto ou apenas escutado (bso by tom waits). aconselho, para um dia na barata salgueiro. e quanto a cenas com esparguete, haverá sempre the lady and the tramp da disney. rauf rauf!