domingo, 18 de janeiro de 2009

Mantas e Retalhos das Vidas



Sempre adorara histórias. As que se ouvem, as que se inventam, as que deixamos apenas fluir na nossa imaginação, sem que nunca as cheguemos a partilhar com os outros.
Começara por escutá-las ao serão, sentada à lareira, quando os luxos dos tempos modernos ainda não tinham banalizado o aquecimento central, e nas casas o aconchego se procurava no calor dos afectos.... e algumas vezes na manta de xadrez da avó.

O frio, o nevoeiro, a nostalgia do fim de tarde de sábado trouxeram-lhe á memória os tempos em que em casa, no inverno, o frio se fazia sentir e se aconchegava na manta de quadrados vermelhos que tantas vezes servira para partilhar e resguardar cumplicidades.

Em dias frios e cinzentos como este as histórias tinham outro sabor e reconduziam muitas vezes a vidas apenas partilhadas pela imaginação.

Resolveu, por isso, ir ao teatro. Lera que a peça falava de vidas que vivemos e de vidas que imaginamos, do que admitimos e do que perferimos fingir. Demasiado banal e obvio.. talvez... mas por vezes temos necessidade de nos perdemos nas banalidades alheias.. tão banais e obvias como as nossas....

Quando pretendeu tomar uma das cadeiras da primeira fila do teatro verificou que sobre ela se encontrava uma manta - identica à da avó - e várias outras, por toda a plateia, em cada duas cadeiras. Regeitou-a, lançando-a para as costas da cadeira em que se sentou. Se calhar não tinham ar condicionado - pensou num primeiro momento.

No palco desfilaram depois pessoas comuns, com as quais todos nos podemos identificar, todas com medos, incertezas, inseguranças, fragilidades... todos á procura da felicidade... todos interiormente sós... todos nascemos e morremos sós, diz um personagem a dado momento.

« and in the end we are all alone »...

Os personagens continuaram as desfilar os amores que não resultam, os que não se concretizam, a coragem que não se tem, os silêncios que minam as relações, as traições, as solidões acompanhadas ( as piores quanto a si )...

O homossexual que procura o amor e a compreensão incondicionais, a mulher casada profissional e mãe, cujo marido, aparentemente perfeito, não partilha com ela quaisquer tarefas ou interesses, o homem casado que não suporta a mulher e descobre o amor numa amante, a mulher independente e livre... ou com medo do compromisso..

Todos igualmente sós ...

Talvez faltasse a todos aqueles personagens uma manta... ou a coragem de a partilhar...

Se calhar a culpa de tudo é do ar condicionado e do aquecimento central- pensou..

Depois lembrou-se que lera no texto promocional que todos aqueles personagens eram pura ficção...

Sorriu mais aliviada, ao relembrar essa certeza, e voltou para casa reconfortada... O ar condicionado do carro marcava 22º....e a manta ficara depositada nas costas da cadeira...

http://monalisashow.blogspot.com/

1 comentário:

norrin disse...

«and in the end we are all alone»... resultado de má escolha, não se deve desprezar a manta. muito menos a partilha