segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

micro-solidões 2


as estúpidas luzes a darem-me nos olhos. e eu que não os consigo fechar.não tarda fundem-se .se calhar já só para a páscoa, com um bocado de sorte lá para o carnaval. não. os da edp vão cortar a luz, ninguém a vai pagar. raio de ideia a minha. dar-me para isto da árvore.e piscam ao ritmo do “white christmas” versão chinesa. já não aguento mais a musiquinha. se ao menos as mãos se mexessem para puxar o fio da tomada. e a boca. deve estar aberta, escancarada, como a dos mortos de três dias. ninguém para me por o lenço na queixada. ninguém vai dar comigo, aqui. ainda melhor. triste figura a minha neste robe de felpo verde. a boca aberta. o verde até vai bem com o branco. mas a morte é mais amarelo marfim. vou parecer uma sopeira embrulhada na bandeira do brasil. uma encomenda mórbida do correio diplomático. valeu-me de muito por o vestido preto na caixa com a naftalina.. e os brincos. tão bonitos. se tivesse aceitado o pedido com os brincos. talvez não estivesse aqui agora, há já uma semana, quatro dias. há quantos dias? talvez tivéssemos filhos. os filhos, pelo menos, telefonam no natal. estranhariam que não atendesse. era incómodo, a princípio, mas lá para o ano novo, depois das exéquias, já estariam apaziguados. encaixotavam-me os tarecos. guardavam os de valor e davam o que não queriam, ou mandavam para o lixo. guardavam as fotografias, por certo, os linhos e as pratas. e eu havia de ter um lugar a sépia numa moldura qualquer nas casas deles. e a gata que não me pára de lamber os pés. já não deve ter comida. mia como uma desalmada a pobre da gata. acaba por me comer os dedos. e as luzes que não param de piscar. estúpida ideia a minha, esta da árvore com as luzes e a musiquinha da loja dos chineses.

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